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Justiça do Pará determina através de suspensão de segurança que ICMS seja cobrado para empresas do agronegócio


A decisão considera que a não aplicação do ICMS a grandes empresas que atuam no Pará tem impactos negativos para a economia do estado.

Porto de escoamento de grãos em Santarém (Pa) / Foto: M'boia


No início do mês de fevereiro, após anos de disputa no judiciário paraense, foi firmado em Acórdão pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJ-PA) o entendimento de que deve ser cobrado o ICMS (Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal) para empresas ligadas a logística de escoamento da produção do agronegócio (grãos e pecuária). Empresas como a Hidrovias do Brasil, Transporte Bertolini, JBS, COFCO, BUNGE e Amaggi estavam na disputa judicial pela não aplicação de ICMS e tiveram seus recursos judiciais desprovidos. O Estado do Pará, em oposição às empresas, alegou que em 2019 a isenção de ICMS permitiu a perda de cerca de 110 milhões de reais em arrecadação.

O referido Acórdão deste mês de fevereiro reforçou o uso do polêmico instrumento do sistema de justiça: a suspensão de segurança. O instrumento é aplicado em caso de existência de risco de grave lesão ao interesse público, o que foi interpretado como aplicável no caso do ICMS a empresas de logística do agronegócio devido ao risco de grave lesão à economia pública do Estado do Pará, em razão do perigo de prejuízos milionários à arrecadação do ICMS incidente sobre operações de transporte.

A suspensão de segurança foi utilizada em situações diversas na Amazônia, e em especial no Estado do Pará, para garantir benefícios a grandes empresas públicas e privadas, a exemplo da UHE Belo Monte e da Estrada de Ferro Carajás. Recentemente, também, foi utilizado no caso da chamada Ferrogrão. A origem da suspensão de segurança está na Lei nº. 4.348 de junho de 1964, e se amplia com a Lei de liminares contra o Poder Público (Lei nº. 8.437/1992). A questão que põe esse instrumento em um debate polêmico é que uma vez concedida a suspensão de segurança a parte prejudicada fica sem possibilidade de reverter a decisão até o trânsito em julgado da sentença. A Medida Provisória nº 2.180-35 de 2001, que alterou dispositivos da Lei 8.437/92, elimina a possibilidade de recurso.

De acordo com pesquisa da Terra de Direitos para casos de grandes empreendimentos na Amazônia, as suspensões ocorrem no âmbito de Ações Civis Públicas movidas por associações ou pelo Ministério Público. Por exemplo, uma vez conferida decisão favorável para impedir que o licenciamento ambiental de uma obra seja encaminhado, a União recorre com pedido de suspensão de segurança à uma instância superior da Justiça e se o pedido for deferido essa decisão não caberá recurso.

O processo judicial sobre o ICMS sobre o transporte de produtos do agronegócio teve como objeto a insegurança jurídica ocasionado pela edição de uma série de decretos estaduais que versavam sobre a aplicação do imposto (Decreto Estadual n. 4.676/2011; Decreto n. 2.242/2018 e Decreto n. 28/2019), o que por sua vez foi objeto de uma série de decisões liminares na justiça paraense, todas essas agora derrubadas por força do Acórdão do TJ-PA.

A decisão da Justiça interfere na movimentação do chamado Corredor Norte (que compete com o Corredor Sul, a partir dos Portos de Santos e Paranaguá), como área de expansão de empresas do agronegócio que modificou a paisagem e as relações econômicas e territoriais, principalmente, a partir dos municípios de Itaituba, Santarém e Barcarena.

A expansão das empresas por contratos de comercialização e por instalação de portos, a exemplo da empresa Hidrovias do Brasil, se dá por favorecimentos estatais como isenção de impostos e por desconsideração de normas não tributárias relativas a licenciamento ambiental (como apontado pelo Ministério Público Federal na Ação Civil Pública nº 312-62.2016.4.01.3908 – TRF1), assim como por descumprimento de regras de financiamento (como apontado pelo Inesc no Dossiê “Enquanto a soja passa: impactos da empresa Hidrovias do Brasil em Itaituba”). A perda de incentivos fiscais pode resultar na diminuição da competitividade da rota de escoamento Corredor Norte para as empresas que atuam no Pará. 

*Pedro Martins é assessor jurídico da Terra de Direitos e coordenador do Programa Amazônia.


Ações: Empresas e Violações dos Direitos Humanos
Eixos: Democratização da justica e garantia dos direitos humanos
Tags: Suspensão de Segurança,ICMS,Justiça do Pará