Resolução para prevenção de violações por pulverização aérea é aprovada pelo CNDH
Franciele Petry Schramm
O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) aprovou na manhã desta sexta-feira (16) uma nova resolução que visa prevenir e reparar as violações de direitos provocadas pela pulverização aérea de agrotóxicos. O documento, que apresenta uma série de diretrizes e recomendações sobre a prática da pulverização, foi aprovado por 12 votos favoráveis e quatro abstenções – todas as abstenções foram por parte dos ministérios federais e do departamento de Polícia Federal que compõem o Conselho.
A resolução proposta é resultado de uma consultoria realizada pela assessora jurídica da Terra de Direitos, Naiara Bittencourt e por Diogo Cabral, assessor jurídico da Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Maranhão. O texto foi construído com base em estudos científicos e contou com a contribuição de uma série de órgãos e entidades, além de ter sido disponibilizado para consulta pública entre os meses de julho e agosto deste ano.
A resolução é um instrumento que deve orientar ações do poder público e do sistema de justiça para garantir que a tomada de ações e as decisões relacionadas à pulverização aérea de agrotóxicos sejam guiadas por princípios que respeitem os direitos humanos. O documento deve ser publicado em breve.
Conselheira do CNDH como membro do setor de Direitos Humanos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Ayala Ferreira explica que a resolução é uma resposta em relação à uma série de denúncias que o Conselho tem recebido por conta do uso intensivo de agrotóxicos aplicado por pulverização aérea. O texto apresentado na resolução destaca oito episódios denunciados. “Foi nossa melhor forma de articular vários setores, especialistas e ativistas para dizer que é necessário que, se nós não conseguimos superar a utilização desses venenos, pelo menos iremos fortalecer mecanismos de controle e de regulamentação dessa atividade que ainda é um problema na nossa sociedade”, destaca.
A resolução aprovada também é um avanço que deve subsidiar novas políticas públicas e proteger ações que já estão em curso no país, na avaliação da engenheira agrônoma da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE), Fran Paula. “Essa resolução vai contribuir também para garantir o direito humano à alimentação saudável e proteger a produção agroecológica nas comunidades que estão diretamente expostas a deriva de agrotóxicos”.
Biomédica servidora pública da Friocruz e membro da Associação Brasileira de Saúde Coletiva Karen Friedrich também aponta que, por conta das grandes áreas de aplicação, a pulverização aérea traz dificuldades à saúde pública, como no acompanhamento das pessoas atingidas por essa forma de aplicação. E reforça como a resolução aprovada é mais um instrumento para proteção das pessoas: “Qualquer medida aplicada hoje no Brasil pra diminuir os impactos dos agrotóxicos – seja a introdução de uma dose segura ou o uso de equipamentos de proteção individual – não protegem totalmente dos impactos dos agrotóxicos sobre a saúde e também sobre o meio ambiente”.
Dados apresentados pelos órgãos de saúde apontam o aumento no número de intoxicações em decorrência de agrotóxicos, nos últimos anos. O relatório nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos, elaborado pelo Ministério da Saúde, aponta para um aumento de 139% entre 2007 e 2015. O Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan) identificou entre 2007 e 2017 um registro de 107.535 casos de intoxicações por agrotóxicos, com 3.452 óbitos.
Diretrizes e recomendações
Entre as diretrizes trazidas no documento, está a revisão das distâncias mínimas para aplicação de agrotóxicos por pulverização aérea e proibição total de pulverização aérea em áreas próximas a terras indígenas, territórios quilombolas e de comunidades tradicionais, com indicação de haja também consulta prévia, livre e informada desses povos.
O documento aponta que, mesmo que hajam regras para esse tipo de aplicação – como na Instrução Normativa nº 2/2008 do Ministério da Agricultura, da Pecuária e Abastecimento –, elas ainda são insuficientes. A Subcomissão Especial sobre o Uso de Agrotóxicos e Suas Consequências à Saúde, da Câmara dos Deputados, aponta que mesmo que as determinações dessa instrução normativa sejam seguidas, somente cerca de 30% do agrotóxico ficará na planta, sendo que os demais 70% irão para o solo (50%) ou para o ar (20%) e regiões circunvizinhas.
Além disso, a resolução reforça a necessidade de criação de um canal unificado para realização das denúncias. Atualmente, as vítimas da contaminação por agrotóxicos precisam acionar diversos órgãos para garantir a reparação da violação de uma série de direitos.
Também são indicadas uma série de orientações que respeitem condições meteorológicas e de apresentação de relatórios operacionais, para além de estabelecer a necessidade de comunicação prévia da aplicação para as comunidades próximas
“E com base em todas essas recomendações, esse arsenal normativo, esses estudos científicos que o poder público deveria desestimular a pulverização aérea de agrotóxicos”, aponta Naiara, que contribuiu na elaboração do documento.
Essa prática de pulverização de agrotóxicos está banida na União Europeia desde 2009.
Contaminação e violação de direitos
Alguns dos principais direitos violados na contaminação por agrotóxicos e as principais dificuldades encontradas para a realização de denúncias e reparação das violações serão apresentados na pesquisa ‘Agrotóxicos e violações de direitos humanos no brasil: Denúncias, fiscalização e acesso à justiça’. O estudo elaborado pela Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Terra de Direitos será lançado durante um webinar realizado no próximo dia 21 de setembro, as 16h. Inscrições podem ser realizadas neste link
Notícias Relacionadas
Webinar discute mecanismos de denúncia de contaminação por agrotóxico
Ações: Biodiversidade e Soberania Alimentar
Eixos: Biodiversidade e soberania alimentar