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Cercados por empreendimentos, povos tradicionais de Santarém (PA) participam de formação sobre consulta prévia


Assegurada na Convenção 169 da OIT, a consulta prévia, livre e informada garante aos indígenas e quilombolas escolherem sobre as ações nos seus territórios

Comunidades quilombolas, povos indígenas, agroextrativistas e integrantes de movimentos urbanos participaram da atividade. Foto: Organização do evento

Um espectro diverso de representantes de povos indígenas, comunidades quilombolas, trabalhadores rurais e agroextrativista e de movimentos urbanos de Santarém (PA) participaram, entre os dias 28 a 30 de março, do Curso de Consulta Prévia e Direitos Humanos.

O curso se inscreve na necessidade de qualificar os sujeitos locais na exigência de consulta prévia aos povos tradicionais mediante o anúncio de qualquer ação ou obra que impactem seus territórios e modos de vida. Objeto de interesse para construção de portos e ferrovias, o município de Santarém (PA), com frequência, tem violado a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), do qual o Brasil é signatário e que dispõe sobre a consulta aos povos tradicionais sobre qualquer intervenção do Estado ou do mercado nos seus territórios.

Um exemplo foi a inclusão de emenda à minuta do Plano Diretor do Município (2019-2029) por vereadores de Santarém. Em acolhimento ao setor do agronegócio e desconsiderando a decisão popular, os vereadores definiram a área do Lago do Maicá como Zona Portuária 3. Com isso, a área que é de preservação ambiental está sujeita a implantação de terminais de uso privado e estações de transbordo de cargas. A construção de novos portos graneleiros na área do Lago resultaria, a exemplo do terminal portuário da Bunge em Miritiba (PA), impactos na biodiversidade e na atividade econômica de comunidades ribeirinhas, além de prejuízos no modo de vida da população.

“O curso foi muito importante para o reconhecimento das lideranças enquanto defensores e defensoras de direitos humanos. Além disso, a percepção de que eles e elas já conhecem o direito à consulta prévia e que agora podem instrumentalizá-lo melhor com os aportes legais que o curso proporcionou. Os participantes destacaram que muitas comunidades são carentes de conhecimentos e que cursos como esses são interessantes justamente por fazer essa informação circular e disponibilizar um material escrito”, aponta o assessor jurídico da Terra de Direitos, Ciro Brito. Para ele a atividade é também importante porque aproxima as organizações participantes da agenda com as lideranças envolvidas nos processos de resistência aos empreendimentos locais.

Diálogo entre direitos humanos e consulta prévia
Na atividade o grupo participante refletiu e debateu sobre a compreensão sobre os direitos humanos. Para a extrativista da Reserva Tapajós-Arapiuns (Resex), na Vila Boim, Natalina Oliveira, a manutenção das relações com o território é central na garantia dos direitos humanos. “É ter direito à educação e à saúde de qualidades, acesso à segurança pública e à informação. É ter acessibilidade à tudo aquilo que temos direito e que nos garante a Constituição. A viver no meu lugar da forma que eu sou, é eu ser respeitada com a minha raiz”, destaca.

De impacto em múltiplas dimensões, os grandes empreendimentos afetam diretamente a biodiversidade, os costumes e crenças de um povo, a relação com a terra e a memória – questões intrinsecamente relacionadas com os direitos econômicos, sociais, culturais e políticos.

“O direito humano é sobre o direito de ir e vir, de eu ter, eu ser, sem que alguém me diga o que preciso. Está na diversidade da vivência. Não pode ser imposto, nasce com o indivíduo. Dignidade é fazer jus a este direito., viver em local saudável, viver em ambiente sadio, ter uma boa água”,  pontua o indígena do povo Munduruku, da aldeia Takuara, Raimundo Abimael, localizada no Baixo-Tapajós.

Construção conjunta
A iniciativa de formação é uma construção coletiva da Terra de Direitos, Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Sindicatos de trabalhadores rurais de Santarém (STTR) e Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular (NAJUP Cabano).

A atividade contou com a participação de integrantes do o Sindicato de trabalhadores Rurais de Santarém (STTR), Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS), Conselho indígena Tapajós Arapiuns (CITA), Federação Das Associações de Moradores e Comunidades Do Assentamento Agroextrativista Da Gleba Lago Grande (Feagle), Organização das Associações da Reserva Extrativista Tapajós Arapiuns(TAPAJOARA), Conselho indígena TI Cobra Grande e  Movimento Popular Urbano.

O curso se insere no plano de trabalho "Assessoria jurídica popular em prol da educação popular sobre o direito à consulta prévia, livre e informada e pela defesa da Convenção 169 das OIT", desenvolvido pela Ufopa, pelo discente Rionaldo Pinto, e sob orientação do professor André Azevedo, e financiado pelo Edital Pibex 009/2018.

 

 



Ações: Empresas e Violações dos Direitos Humanos

Eixos: Terra, território e justiça espacial