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Diagnóstico colaborativo no Paraná identifica que agentes do Estado são os maiores violadores do direito à manifestação


Criminalização de lideranças, abuso de autoridade e seletividade foram algumas das formas de repressão apontadas por integrantes de movimentos sociais e populares

Caso emblemático da violência contra manifestações no Paraná, o ataque da Polícia Militar contra servidores da educação no episódio conhecido como o Massacre do Centro Cívico, no dia 29 de abril de 2015, não é um fato isolado. Isso é o que mostra o Diagnóstico Prévio de Repressão à Liberdade de Manifestação no estado, construído e debatido por integrantes de movimentos sociais, de sindicatos e organizações populares na tarde desta quarta-feira.

O debate realizado na Universidade Federal do Paraná reuniu cerca de 40 pessoas para identificar as principais violações ao direito à manifestação no Paraná. A atividade integra a programação do Seminário ‘Direito à manifestação e Sistema de Justiça’, que iniciou neste dia 20 e segue até o dia 22 de junho, em Curitiba.

Violência física, ameaças, criminalização, abuso de autoridade e perseguição contra lideranças de movimentos sociais foram algumas das principais formas de repressão do direito à manifestação apontadas pelas pessoas presentes. E, assim como no episódio do Massacre do Centro Cívico, o Estado é o principal agente violador desse direito, como mostram diferentes casos.

Um deles é o da perseguição contra estudantes secundaristas, que protagonizaram a ocupação de escolas em outubro de 2016, como forma de barrar a proposta de reforma do currículo do ensino médio. No Paraná, mais de 850 escolas e universidades foram ocupadas. Um ano e meio depois disso, estudantes e familiares ainda respondem ações na Justiça. Em alguns casos estudantes foram condenados a pagar cerca de mil reais. “Todos foram julgados sem direito de defesa, nem foram convocados para participar do processo”, denuncia o presidente da União Paranaense dos Estudantes Secundaristas, Wellington Tiago.

Tentativa de enfraquecimento

Integrante do Centro de Estudos Constitucionais da UFPR e pró-reitor de Extensão e Cultura da mesma universidade, Leandro Gorsdorf destaca que a perseguição contra lideranças é uma das estratégias para fragilizar a organização coletiva.  “É muito mais fácil você criminalizar individualmente, para fragilizar o sujeito”, reflete.

Casos assim foram registrados em diferentes situações. Professores da rede pública de ensino – além de sofrerem com a violência policial no dia 29 de abril de 2015 – ainda enfrentam processos judiciais.  Um dos diretores da APP-Sindicato dos Servidores em Educação do Paraná,  Arnaldo Vicente concorda que a criminalização de lideranças de movimentos e sindicatos é parte da estratégia de enfraquecimento, mas que é preciso ampliar a resistência frente à esse cenário. “Estamos sendo criminalizados, sim, mas não abrimos mão do enfretamento. O problema é também quando a criminalização nos torna retraídos e enfraquece a nossa organização”, avalia.

Seletividade

Ouvidor-geral da Defensoria Pública do Estado do Paraná, Gerson da Silva destacou que o processo de criminalização de manifestações é diferente entre os grupos, e destacou a seletividade do poder judiciário na repressão desses casos. “Não são todas as manifestações que são criminalizadas. Em algumas delas os policiais até posam para fotos”, brinca.

Exemplo da seletividade do Poder Judiciário pode ser observado nas mobilizações em defesa do ex-presidente Lula, em Curitiba. Desde o dia 8 de abril, integrantes de diferentes movimentos sociais acampam a uma quadra da Polícia Federal, onde Lula está preso. O acampamento recebeu o nome de Vigília Lula Livre e tem sido alvo de diferentes ataques.

No dia em que o ex-presidente chegou na capital paranaense, no dia 7 de abril, cerca de duas mil pessoas foram atacadas por policiais militares com bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha. Cerca de 40 pessoas ficaram feridas na ação. Enquanto isso, manifestantes contrários a Lula que estavam próximos soltavam fogos de artifício que poderiam acertar o helicóptero que trazia o ex-presidente, mas não foram reprimidos.

Além disso, decisões judiciais determinaram horários máximos para a concentração de pessoas na vigília Lula Livre, impediram a utilização de sistema de som. Uma liminar também tenta retirar a mobilização do local, alegando, entre outras coisas, que o barulho e o trânsito de pessoas prejudicaria os moradores da região. Integrante do coletivo Advogados e Advogadas pela Democracia (CAAD), Tânia Mandarino aponta que todas as ordens de silêncio são cumpridas pelos integrantes da Vigília Lula Livre, mas movimentos contrários à Lula não são notificados por desrespeitarem os acordos. “Se reclama de barulho de um grupo, mas outro grupo [ com a participação de membros do MBL] pode fazer o que quiser”, denuncia.

Diretor da Associação Cultural de Negritude e Ação Popular (Acnap), Nivaldo Arruda, conhecido como Paulo Borges, também lembra que as pessoas negras costumam ser as mais afetadas pela repressão e pela seletividade penal. “A violência contra a população negra não é simbólica, ela é direta”. Ele lembra de casos em que negros foram presos durante manifestações, mesmo quando não participavam delas. Exemplos disso são registrados em todo o Brasil, como no caso do jovem negro Rafael Braga, preso no Rio de Janeiro no dia 20 de junho de 2013, durante um ato que não participava. Rafael segue preso em prisão domiciliar.



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Ações: Defensores e Defensoras de Direitos Humanos, Democratização da Justiça

Eixos: Política e cultura dos direitos humanos