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A Morte do Sindicalista Brasilia


Na verdade, o contexto que ensejaria o assassinato do Brasília começou a se delinear por ocasião das Eleições Municipais de 2000, quando Bartolomeu Moraes da Silva lança-se candidato a vereador. Era pública e notória a enorme influência que possuía junto à população. Em especial, nesse momento político, é evidenciada toda a sua força e carisma junto ao povo de Castelo dos Sonhos. Isso despertou a atenção e hostilidade dos fazendeiros locais, tradicionais dominadores absolutos.Brasília era simplesmente a grande referência da população daquele Distrito, distante 1.200KM da sede do Município e por isso mesmo tão abandonado. Em qualquer situação de injustiça com os trabalhadores rurais ele era procurado e dispensava todo apoio e auxílio. Dono de um grande poder de articulação, suas interferências junto às autoridades eram freqüentemente muito bem sucedidas. Por ter um certo conhecimento, era comum discutir com autoridades autoritárias como, por exemplo, Delegados de Polícia arbitrários e sempre se sobressaía. Além disso, possuía articulação também em Altamira, Belém e Brasília, onde suas demandas sempre eram frutíferas. Brasília era um autentico militante dos Direitos Humanos, uma espécie de "advogado" do povo, pois até o relaxamento de prisões ilegais ele obtinha com sua persistência, coragem e determinação.

Por outro lado Castelo dos Sonhos sempre foi a típica cidade onde imperava em absoluto a impunidade. Simplesmente NUNCA havia ocorrido qualquer investigação, inquérito ou processo penal acerca dos homicídios lá ocorridos. Caso ilustrativo ocorreu envolvendo o próprio executor da morte de Brasília, o pistoleiro MARCIO ANTONIO SARTOR, conhecido por "Márcio Cascavel", que segundo relatos de pessoas da cidade já matou um homem conhecido por "Grande" no meio da rua. Todo mundo viu e nada foi feito. Mandou matar outro apelidado de "Paraguai" e a impunidade continuou.

Portanto, nesse contexto das eleições 2000, em que evidenciou-se a força política de Brasília, ouviu-se correr pela cidade que um grande e temido fazendeiro da região, ALEXANDRE MANOEL TREVISAN, vulgo "Maneco" falou para "Buzato" que já era hora do Brasília morrer. Essa informação chegou até a vítima por meio do Sr. João, vendedor de pão-de-queijo;

Segundo relatos testemunhais, Maneco, não é um simples fazendeiro, exerce também a função de pistoleiro da classe pecuarista de Castelo dos Sonhos. É um homem muito frio, que já matou muitos outros. Inclusive há quem saiba a localização de um cemitério clandestino em Castelo dos Sonhos, onde estão enterrados corpos de pessoas que ele teria queimado vivas. Um era conhecido por Cuia e era de Castelo mesmo, o outro era de Guarantan, no Mato Grosso.

De conformidade com provas testemunhais Quikão era um pistoleiro de Castelo dos Sonhos que, certa vez falou para o Brasília que recebera a proposta de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) do Maneco, para mata-lo. E acrescentou que respondeu que naqueles tempos estava de férias e não poderia aceitar a "encomenda". Na ocasião Quikão alertou Brasília de que com certeza outro pistoleiro toparia o serviço. Em seguida Quikão foi assassinado. Teria sido por Zumba, a mando de Maneco.

Nilton Braga era dono da Fazenda Big Vale (grilada). Vendeu parte para o madeireiro Nilo. Mais ou menos trinta posseiros ocuparam esta fazenda. Houve grande confusão. Brasília foi chamado pelos trabalhadores, pois era visto como o único capaz de intermediar uma solução mais favorável para os posseiros. Maneco interferiu e pessoalmente prendeu 19 posseiros levando-os para o tenente Márcio Abud Barbalho. Os presos foram trazidos para Altamira. Brasília ficou em Castelo lutando pelos direitos dos outros posseiros.

Certo dia, os posseiros que ficaram na fazenda conseguiram cercar os pistoleiros que os vigiava e tomaram as armas do mesmo. Em seguida chamaram Brasília e entregaram a ele as armas apreendidas. Por sua vez, Brasília as entregou para o Tenente Márcio Abud. Este falou para o Brasília que o delegado Willian havia pedido a prisão preventiva dele e o alertou para que se escondesse e disse ainda para que tomasse cuidado, pois morreria no meio da rua. Esse alerta deu-se sábado, 20 de agosto, pela manhã e domingo à noite Brasília foi assassinado.

Por intermédio de Brasília os 19 detentos foram colocados em liberdade. O povo nas ruas estava em festa, receberam-nos com fogos e carregaram Brasília nos ombros até o Sindicato. Quinze dias após esse fato ele foi assassinado. Um senhor conhecido por Zé Bravo, pistoleiro e compadre de Maneco, dois dias antes do crime, avisou para o Brasília tomar cuidado, pois o Maneco queria matá-lo.

2. A TOCAIA E O ASSASSINATO

Domingo, 21 de julho, por volta das 18:00, Brasília se dirigia para o hotel de JUVENAL OLIVEIRA DA ROCHA, o Parazinho, a convite deste, que o atraiu para a emboscada.

Segundo a testemunha ocular, Arlindo de Sousa, Brasília subiu na caminhonete com ALEXANDRE MANOEL TREVISAN (Maneco) e MARCIO ANTONIO SARTOR (Márcio Cascavel). Ao chegarem no local do crime, Maneco parou a caminhonete e ambos desceram do carro. Conversavam e Brasília articulava, como quem explica alguma coisa. Nesse momento, Márcio Cascavel vem por trás, sem que a vítima percebesse e efetua os disparos.
Em seguida levaram o corpo e deixaram em outro local.

No dia seguinte ao assassinato (22/07/2002) uma equipe da Polícia Civil dirige-se para o Distrito de Castelo dos Sonhos, chefiada pelo Delegado Aurélio W. Rodrigues de Paiva e prendem em flagrante dois suspeitos de terem participado do homicídio: MARCIO ANTONIO SARTOR E JUVENAL OLIVEIRA DA ROCHA.

No dia 13 de agosto foi decretada a prisão temporária do acusado de ter efetuado os disparos MARCIO ANTONIO SARTOR, O "MÁRCIO CASCAVEL" e dez dias depois foi convertida em prisão preventiva, sendo que até o momento ainda não foi revogada. Em setembro de 2002 é decretada a prisão preventiva do fazendeiro ALEXANDRE MANOEL TREVISAN, porém nunca foi cumprida, pelo fato do mesmo não ter sido encontrado.

No mês seguinte os advogados impetram Hábeas Corpus preventivo no Tribunal de Justiça do Estado do Pará visando revogar a preventiva. Sem êxito, recorrem ao STJ e conseguem um salvo conduto assegurando a liberdade do acusado, que assim pôde comparecer ao interrogatório, garantindo a instrução processual.

Em fevereiro de 2003 os advogados de defesa impetram pedido de revogação de prisão preventiva dos encarcerados e o representante do Ministério Público manifesta-se favorável à soltura pelo excesso de prazo na formação da culpa. Entende ainda que não há elementos suficientes para a propositura da ação penal e dá parecer favorável a liberdade dos acusados, o que seria o fim de qualquer esperança de punibilidade dos responsáveis pelo crime.

As entidades organizadas reagem, a juíza hesita e tenta ganhar tempo. Por força do acaso um Promotor de Justiça de Belém vem à Altamira substituir o titular da primeira promotoria que se encontra de férias, pega o processo e oferece denuncia. Está garantida a manutenção da preventiva.

Isso gera um mal estar entre os promotores locais. O promotor responsável pelo caso declara-se suspeito por motivo de foro íntimo. O processo é encaminhado à Procuradoria Geral na capital para ser designado novo profissional. A responsabilidade recai sobre o titular da primeira promotoria que também se declara suspeito por motivo de foro íntimo.

Finalmente é redesignado para o segunda promotoria onde se encontra até hoje.

Em outubro de 2003 é realizada a audiência de qualificação e interrogatório dos réus. Daí em diante o processo permanece parado, pois logo iniciam-se as chuvas e o deslocamento Castelo dos Sonhos-Altamira torna-se impossível por via terrestre, inviabilizando a intimação e vinda de testemuhas. O Juiz da época solicita verba ao tribunal para fretar um avião a fim de realizar a instrução in loco, mas nunca obteve resposta.

Em abril de 2004 é julgado em definitivo o HC de ALEXADRE MANOEL TREVISAN e é revogada a liminar, voltando a ter eficácia o decreto de prisão preventiva do juiz de primeira instancia. A ordem está desde o dia 03 de maio com o Superintendente da Policia Civil, Delegado Pedro Monteiro, que alega falta de condições para realizar a diligencia.

Agora, o atual juiz titular da Vara Criminal deverá marcar a primeira audiência de instrução para agosto, mas estuda a hipótese de revogar a prisão preventiva, para garantir o comparecimento do acusado ALEXANDRE MANOEL TREVISAN aos atos processuais, sob pena dele permanecer foragido e ter que suspender o processo, não se lhe aplicando a lei penal.

Urge que se faça as autoridades cumprir a ordem de prisão. O tempo se esgota e os dois que permanecem presos poderão avocar constrangimento ilegal e obter ordem de HC junto ao STJ, o que seria o fim da esperança de responsabilização criminal dos envolvidos.

Altamira-PA, 01 de junho de 2004.



Ações: Biodiversidade e Soberania Alimentar

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