Notícias / Notícias



Proteção para defensores e defensoras de direitos humanos é estratégica via de enfrentamento à crise climática


Na 28ª COP em Dubai, relator das Nações Unidas trouxe alerta sobre a violência contra quem defende o meio ambiente e territórios 

Delegação da COIAB com lideranças indígenas na COP-28 em Dubai. — Foto: Pepyaká Krikati

 

Hoje, 09 de dezembro, marca o Dia Internacional das Pessoas Defensoras dos Direitos Humanos. A data reacende o debate sobre os problemas enfrentados e a crescente violência contra quem atua na luta por garantia de direitos, em especial na defesa do meio ambiente. Em um cenário de aumento de assassinatos de lideranças de movimentos sociais, o Brasil tem sido cobrado pela sociedade civil e organismos internacionais a garantir a proteção efetiva a vida desses atores. Na corrida pela reformulação das políticas voltadas para o tema, a sociedade civil enfatiza o teor emergencial de enfrentamento aos conflitos territoriais e ambientais, atualmente a maior causa de mortes de defensores de direitos humanos no país.   Tamanha relevância no debate garantiu que o tema estivesse presente inclusive na 28ª sessão da Conferência das Partes (COP28) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) que acontece até dia 12 de dezembro, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos (EAU). 

As violências contra as vidas como de Marielle Franco, Mãe Bernadete, Dom Phillips e Bruno Pereira foram notícia nos jornais pelo Brasil e pelo mundo. Além de lideranças comunitárias e parlamentares, as e os defensores também são advogadas e advogados, campesinos, jornalistas, povos e comunidades tradicionais, quilombolas, indígenas, sindicalistas ou ativistas pelo meio ambiente que lutam por reconquistar direitos e promover liberdades.  

Dados produzidos pela Terra de Direitos e pela Justiça Global no relatório 'Na linha de Frente" apontam 1171 casos de violência, sendo 169 assassinatos e 579 ameaças nos últimos quatro anos. O estudo mostra o acirramento de conflitos territoriais e ambientais no país, com casos registrados em todos os estados brasileiros.  

Amplamente denunciado durante a COP, as pessoas que defendem o território e meio ambiente são as que mais sofrem violência no Brasil. Segundo o relatório, defensores indígenas foram alvos de grande parte das violências sofridas por defensores de direitos humanos:  346 casos, sendo 50 assassinatos e 172 ameaças. Vale ressaltar que o quadriênio analisado pelo estudo foi marcado pela adoção de uma política anti-indígena pelo governo federal e aumento da invasão e exploração dos territórios tradicionais pelo garimpo, desmatamento e agronegócio.   

Um levantamento do MapBiomas mostrou que as terras indígenas perderam menos de 1% de sua área de vegetação nativa nos últimos 38 anos., enquanto nas áreas privadas, a devastação foi de 17%. Os dados reforçam a importância da política de demarcação de territórios indígenas como fonte de preservação da biodiversidade e do equilíbrio climático. Em fala recente a líderes internacionais, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara destacou que: “se 82% da biodiversidade do planeta está sob a guarda dos povos indígenas no mundo, é urgente proteger os direitos desses povos. Se os direitos dos povos indígenas no mundo, os modos de vida, estão ameaçados, toda essa biodiversidade está ameaçada. Se essa biodiversidade está ameaçada, portanto, a humanidade inteira está em risco”. 

Para a liderança indígena e coordenadora do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA), Auricélia Arapiuns, que está ameaçada desde 2018 por causa de sua luta em defesa dos direitos dos povos indígenas e proteção da floresta amazônica, "não tem como fazer justiça climática se não demarcar os territórios indígenas. Não tem como fazer justiça climática liberando agrotóxicos, envenenando os nossos territórios, a nossa gente, o nosso povo, a nossa floresta, acabando com os nossos rios, com fogo, enfim...tudo que a gente vem vivendo. Então, justiça climática para nós é demarcação, é a proteção dos nossos territórios que o governo não faz e o Congresso Nacional fica na contramão do discurso da justiça climática". 

COP e a importância de defensores ambientais 

No último dia dois de dezembro o relator especial das Nações Unidas para os defensores ambientais, Michel Forst – que anteriormente foi o relator especial para os defensores dos direitos humanos – destacou durante a 28ª COP que está preocupado com as frequentes perseguições, criminalizações e restrições de direitos contra defensores ambientais, e que "tentativas de sufocar a voz dos defensores ambientais, através de restrições ao espaço cívico e direitos fundamentais e liberdades, apenas aumentam a urgência de agir".  

Forts ainda enfatizou no informe que "a crise ambiental das mudanças climáticas, poluição e perda de biodiversidade é um grande desafio em matéria de direitos humanos: as mensagens que os defensores ambientais procuram transmitir estão em linha com os muitos avisos dos cientistas sobre a catástrofe que nos espera". E que não é viável que "aqueles que lutam contra as mudanças climáticas vejam as suas liberdades fundamentais restringidas e os seus direitos violados, simplesmente por exigir que os governos, as empresas e toda a sociedade enfrentem esta crise com a urgência necessária para preservar o futuro do nosso planeta e das suas espécies, incluindo a humanidade". 

Este ano a Terra de Direitos também esteve presente na 28ª COP, junto a comitiva Grupo Carta de Belém e outro movimento...., e teve acesso ao informe divulgado pelo relator especial das Nações Unidas para os defensores ambientais.  Acesso ao documento completo.  

Na avaliação da assessoria jurídica a Terra de Direitos, Alane Luzia da Silva, "a situação atual das defensoras de direitos humanos é muito emblemática. Nossa pesquisa mostrou a absoluta hostilidade e violência que se pratica contra este grupo, em razão de suas lutas e de tudo que representam. Essa violência tem entre suas causas a falta de reconhecimento do Estado Brasileiro da importância das defensoras e defensores para a garantia da democracia e todos os demais direitos e a falta de responsabilização dos violadores".  

A advogada da Terra de Direitos ainda destacou uma medida importante para o Brasil avançar na proteção de defensores ambientais, dado seu maior índice de violência vivenciada. "As defensoras e defensores de terra, território e meio ambiente são os mais atingidos, com quase 80% dos casos registrados na pesquisa que realizamos, lançada em 2023. Esse fato evidência a importância da ratificação do Acordo de Escazú, assinada pelo Brasil em 2018 e que garante proteção para defensores ambientais, além de trazer os direitos de acesso: à justiça, participação e informação." 

O Acordo Regional sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e no Caribe, adotado em Escazú (Costa Rica) em 4 de março de 2018, se apresenta como o primeiro tratado sobre assuntos ambientais da região da América Latina e Caribe, o primeiro no mundo que inclui disposições sobre os defensores dos direitos humanos em temas ambientais. O acordo ainda não foi ratificado, ou seja, incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro e está pronto para ser votado pela Comissão de Relações Exteriores desde setembro deste ano quando relatório foi apresentado, favorável ao projeto, pelo Deputado Amom Mandel (CIDADANIA/AM). O Acordo ainda precisa passar por mais três comissões e votado pelo plenário da Câmara dos Deputados.  

Brasil na corrida pela proteção  

Nos últimos dias 05 e 06 de dezembro aconteceu o primeiro encontro presencial do Grupo de Trabalho Técnico (GTT) Sales Pimenta, composto por movimentos sociais e organizações da sociedade civil, entre elas a Terra de Direitos, e chefiado pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. O Grupo foi instituído para repensar as políticas de proteção nacionais para Defensores de direitos humanos. 

Foto: Reprodução GTT Sales Pimenta

A ação inicial do GT para o aprimoramento do Programa Nacional Proteção dos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas aconteceu quase 3 anos após a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF), que condenou a União a elaborar um Plano Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos. Em recentes manifestações as organizações sociais que atuam neste tema destacaram a lentidão para o início das ações do Governo Federal diante da alarmante situação de violência instaurada contra defensores de direitos humanos.  

Na avaliação do coordenador executivo da Terra de Direitos, Darci Frigo a principal dificuldade do GT é atuar pela reformulação da política nacional e agir emergencialmente diante intensa violência instaurada no país.  

"A medida que tivemos uma demora na instalação dos trabalhos do GT e não houve a reformulação do Conselho Deliberativo do Programa Nacional, o GT vai ter que trabalhar em duas linhas paralelas: terá que pensar em medidas de curto prazo para ser inclusive apresentadas ao MDHC e, ao mesmo tempo, pensar a política de médio e longo prazo – para dez anos -, com um plano para a proteção de defensores".  

Frigo ainda enfatiza que não é conhecido pelas organizações até o momento qual deve ser o orçamento público destinado para implementação da Política Nacional. "Na próxima agenda do Grupo de Trabalho, em janeiro de 2024, o GT irá construir um cronograma de audiências públicas, de reuniões focadas em determinados temas e públicos e ao mesmo tempo vai pensar o que o Programa precisa para funcionar. Esse ano já houve uma recomposição mínima de orçamento, mas nesse momento ainda não temos ideia sobre os recursos que estarão disponíveis no próximo ano, mas temos em mente a necessidade de garantir a estrutura de equipe, e recursos para atuação nacional e estadual." 



Ações: Defensores e Defensoras de Direitos Humanos

Eixos: Terra, território e justiça espacial