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Organizações da Sociedade Civil divulgam Carta Aberta sobre indicações para Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio


Hoje, a Comissão responsável por indicar 12 dos 27 membros da CTNBio reúne-se em Brasília, para elaborar a lista tríplice para indicação dos novos membros da CTNBio.As organizações solicitam que a Comissão leve em consideração, nas indicações, a existência de conflitos de interesse e também a necessidade de indicações que contemplem todas as áreas de atuação previstas em lei (saúde humana, saúde animal, vegetal e ambiental).

Para a sociedade civil, a CTNBio, nestes dois anos, não observou adequadamente a questão dos conflitos de interesse. Vários membros da Comissão, que atuam em pesquisas de desenvolvimento comercial de organismos transgênicos ou mesmo que atuam em projetos financiados por empresas de biotecnologia, participaram da análise de processos de liberação comercial de transgênicos.

As organizações também questionam o fato de que nenhum dos especialistas em meio ambiente indicados anteriormente pelo Ministério da Ciência e Tecnologia terem notório saber científico e efetivo saber profissional na área ambiental, conforme exige a Lei de Biossegurança (artigo 11, inciso I).

A falta desses cientistas, certamente, compromete a avaliação de riscos ambientais. Na avaliação das entidades, boa parte da controvérsia bem como das disputas judiciais que envolvem a atuação da CTNBio resulta de sua composição, mais ligada à promoção dos transgênicos do que da biossegurança e do princípio da precaução.

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[1] Conforme Portaria GM/MCT nº 848, de 28.12.2007, publicada no DOU em 31/12/2008. Disponível em http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/68220.html

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Informações:
Maria Rita Reis - Terra de Direitos 41 9916 4189
Andrea Salazar - IDEC 11 3672 3817
Gabriel B. Fernandes - AS-PTA 21 8124 0095

Assinam esta nota: AAO Associação de Agricultura Orgânica ANA Articulação Nacional da Agroecologia AS-PTA Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa CPT Comissão Pastoral da Terra FBOMS Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor Greenpeace IDEC Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor ISA Instituto Socioambiental MMC Movimento de Mulheres Camponesas MPA Movimento dos Pequenos Agricultores MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra Terra de Direitos Via Campesina

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Carta aberta à Diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, à Academia Brasileira de Ciências, ao Ministério da Ciência e Tecnologia e à Comissão ad hoc encarregada de elaborar lista tríplice, destinada a identificar especialistas em efetivo exercício profissional, de notório saber técnico e científico, para compor a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio.

Ilustríssimos Senhores,

A legislação brasileira de biossegurança conferiu ao Ministério da Ciência e Tecnologia, à Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e à Academia Brasileira de Ciência o relevantíssimo papel de indicar à CTNBio 12 especialistas, de notório saber científico e em efetivo papel científico e técnico, das àreas de saúde humana, saúde animal, meio ambiente e vegetal para compor a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (art. 7º, Decreto 5.591/05).

A CTNBio completa este ano, dois anos de funcionamento. Novas listas tríplices deverão ser elaboradas e novos representantes deverão ser designados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Entendendo que a tanto a SBPC quanto a ABC são, acima de tudo, organizações científicas preocupadas com o interesse público, gostaríamos de dirigir a Vossas Excelências as seguintes considerações sobre as indicações:

1. Observações quanto a situações de conflitos de interesse A questão dos conflitos de interesses é - no mundo todo - uma das mais sensíveis relacionadas ao desenvolvimento de pesquisas, como vem sendo, mais e mais, revelado à sociedade . Diversos estudos apontam a influência que motivações econômicas, políticas, pessoais e outras podem exercer diretamente no resultado de pesquisas e na tomada de decisões que têm impactos diretos na saúde dos seres humanos e no meio ambiente.

Em 1999, a então presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Drª Glaci Zancan, alertava que: "o problema do conflito de interesse precisa ser encarado pela comunidade para evitar que as decisões dos órgãos técnicos sejam contestadas em sua legitimidade.(...) Sempre foi praxe da comunidade científica não opinar sobre projetos de sua própria instituição, mas agora é preciso mais. É preciso evitar que interesses comerciais, pessoais ou institucionais se misturem aos acadêmicos.

É chegada a hora de considerar na escolha dos membros das comissões e comitês, emissores de pareceres oficiais, além da competência técnica que os currículos podem refletir, o conflito de interesse"(Jornal da Ciência, SBPC, 05/12/2005). A biotecnologia é uma das indústrias que movimenta maior volume de recursos, inclusive para P&D.

O poder econômico destas empresas também se manifesta em um grande investimento em proganda e "lobby" junto aos órgãos reguladores e associações de pesquisadores. Casos de corrupção para facilitar a liberação comercial de transgênicos chegaram a ocorrer em vários países, como na Indonésia, em que a Monsanto subornou funcionários públicos para que a liberação do algodão transgênico fosse liberado sem a realização de estudos de impacto ambiental.

Graças a isto, a transnacional de biotecnologia foi multada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos. A legislação brasileira não admite qualquer conduta de agente público que objetive fim estranho e/ou contrário ao interesse público, destacando-se os princípios basilares do artigo 37 da Constituição Federal; mas também a Lei de Improbidade Administrativa; o Código de Conduta da Alta Administração Federal; o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal; o Estatuto do Servidor Público; entre outros diplomas legais. A Lei de Biossegurança abordou o assunto nos seguintes termos: "Os membros da CTNBio devem pautar a sua atuação pela observância estrita dos conceitos ético-profissionais, sendo vedado participar do julgamento de questões com as quais tenham algum envolvimento de ordem profissional ou pessoal, sob pena de perda de mandato, na forma do regulamento".

O Decreto nº 5.591/2005 regulamentou esta questão, estabelecendo que "O membro da CTNBio, ao ser empossado, assinará declaração de conduta, explicitando eventual conflito de interesse, na forma do regimento interno" (§ 1º, art. 14). Além disso, de acordo com o Decreto, o conflito de interesse também poderá ser argüido por organização da sociedade civil legitimada para tanto ou por membros da própria Comissão. Infelizmente, este assunto não tem recebido a devida atenção por parte da CTNBio.

Um exemplo concreto é que as declarações de conflito de interesse, obrigatórias por lei, somente foram assinadas pelos membros da Comissão, após Recomendação do Ministério Público Federal. E, ainda assim, as referidas declarações de conduta firmadas pela maior parte dos membros da CTNBio não permite aferir, por serem genéricas, a ocorrência de situações de conflitos de interesse.

No entanto, os currículos de diversos membros da atual CTNBio confirmam sua participação em atividades relacionadas ao desenvolvimento de organismos geneticamente modificados - inclusive para fins comerciais - e atestam algum envolvimento profissional com empresas que são diretamente parte ou interessadas em processos sob análise pela CTNBio.

Ressalte-se que as organizações signatárias não estão fazendo qualquer juízo de valor ou afirmando a ocorrência de ato de improbidade. Mas, tão somente, demonstrando existência de conflitos de interesse devido ao envolvimento profissional do pesquisador em projetos que tornam inviável sua participação na Comissão Técnica Nacional de Biossegurança.

2. Observações quanto ao perfil das indicações Conforme a Lei de Biossegurança, artigo 11, inciso I, alíneas a a d, e o Decreto 5.591, compete à SBPC e à ABC, indicar 12 cientistas, com notório saber científico e efetivo saber profissional nas áreas de saúde humana, saúde animal, vegetal e meio ambiente para compor a CTNBio - devendo ser 3 especialistas em cada uma das áreas.

No entanto, a análise dos currículos dos representantes da área ambiental, que constam do próprio site da CTNBio, demonstra que os pesquisadores indicados, embora tenham experiência em outras áreas, não possuem qualquer atuação profissional ou acadêmica relacionada à área ambiental. De acordo com os textos elaborados pelos próprios pesquisadores em seus currículos disponibilizados na plataforma Lattes, o perfil dos especialistas na área ambiental têm suas carreiras direcionadas para outras áreas e nenhuma atuação profissional na área de meio ambiente.

Consideramos que a presença de especialistas em meio ambiente, com atuação acadêmica e profissional, além de legalmente obrigatória, é também essencial para que as análises de risco possam contemplar de forma adequada a questão ambiental. Assim, solicitamos à Academia Brasileira de Ciências - ABC, à Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC e, especialmente, ao Ministério da Ciência e Tecnologia, nas indicações a serem realizadas para o próximo período na CTNBio, que:

a) Não sejam indicados pesquisadores envolvidos em pesquisas para o desenvolvimento comercial de organismos geneticamente modificados e/ou pesquisas financiadas por empresas que desenvolvem produtos geneticamente modificados;

b) Observem, nas indicações dos especialistas, a necessidade de contemplar especialistas com efetiva atuação profissional e acadêmica, sendo 3 na área vegetal, 3 na área de saúde humana, 3 na área de saúde animal e 3 em meio ambiente, nos termos precisos do artigo 11, inciso I, alíneas a a d, da Lei 11.105/05, quanto à;

c) Consultem as sociedades científicas nas áreas de meio ambiente, saúde e saúde do trabalhador para que estas indiquem nomes dentre seus filiados;

d) Implementem um mecanismo de "prestação de contas" no qual os pesquisadores indicados para representar suas entidades na CTNBio tenham a oportunidade de relatar periodicamente a seus pares um balanço do trabalho da Comissão e de sua participação nela, valendo-se inclusive de congressos e outros eventos científicos para este fim; e

e) Dêem ampla publicidade ao processo de consulta às entidades filiadas em busca de indicações;

f) Fomentem debates acerca de conflitos de interesse relacionados à ciência.

Assinam esta carta aberta:
AAO Associação de Agricultura Orgânica
ANA Articulação Nacional da Agroecologia
AS-PTA Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa
CPT Comissão Pastoral da Terra
FBOMS Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente
Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor
Greenpeace
IDEC Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
ISA Instituto Socioambiental
MMC Movimento de Mulheres Camponesas
MPA Movimento dos Pequenos Agricultores
MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Terra de Direitos
Via Campesina



Ações: Biodiversidade e Soberania Alimentar

Eixos: Biodiversidade e soberania alimentar