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Violação dos direitos de comunidades quilombolas pelo Estado brasileiro é tema de debate em Porto Alegre


Quilombos da região sul e organizações sociais também refletem sobre a responsabilidade do Judiciário em garantir o direito constitucional ao território.

Presentes no debate, quilombolas da Comunidade Paiol de Telha (PR) reivindicam a efetivação do direito ao território. Foto: Lizely Borges

A paralisação do andamento dos processos de titulação de comunidades quilombolas pelo Estado brasileiro está no centro do debate realizado na próxima segunda-feira (16), em Porto Alegre (RS). Na agenda, quilombos localizados na região sul do país, organizações sociais, redes de articulação da pauta e advogados populares refletem sobre como esvaziamento, no último período, do orçamento destinado para a titulação dos territórios tradicionais e a ausência de plano de metas pelo governo federal posiciona o Estado brasileiro como violador dos direitos humanos desta população quilombola.

Comunidades descendentes de populações negras escravizadas, os quilombos estão inscritos na Constituição Federal. É garantido aos remanescentes o direito à propriedade definitiva, com responsabilidade do Estado em emitir os títulos das áreas. No entanto, de acordo com os organizadores do debate, este direito tem sido alvo de ameaças de várias frentes.

Sob comando de opositores à política quilombola, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) – órgão responsável pela titulação das comunidades – reserva apenas a cifra anual de R$3.423.082,00 para a reconhecimento e indenização dos 1.716 processos de titulação abertos no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Deste valor, apenas R$ 423.082,00 é apresentado como rubrica destinada à aquisição das áreas. A quantia é muito inferior aos mais de R$ 27 milhões atualmente necessários para a aquisição de terras de 17 comunidades quilombolas que já foram vistoriadas, avaliadas e que aguardam apenas a desapropriação dos imóveis, segundo dados disponibilizados em 2018 pelo Incra. De acordo com os realizadores da atividade o orçamento deste ano - de menor valor desde que o Estado passou a destinar recursos para a titulação, em 2010 - paralisa por completo a política de titulação de territórios quilombolas.

O diminuto orçamento contrasta com a destinação de R$ 225,59 bilhões para execução do Plano Safra 2019/2020 no atendimento, em especial, ao agronegócio. Para o respectivo biênio foi dobrada a disponibilização orçamentária para o seguro rural e aumentado em 32% o orçamento para custeio e investimento aos médios produtores em relação ao Plano anterior.

Em levantamento realizado pela organização Terra de Direitos, com o orçamento e a demandas apresentadas ao Incra o Brasil deve levar cerca de 1.170 anos para titular a totalidade das comunidades quilombolas

As declarações do presidente Jair Bolsonaro (PSL), de não avançar nenhum passo na titulação de territórios quilombolas e a reconfiguração administrativa dos ministérios, com ocupação das pastas da área por ruralistas, é objeto de denúncia internacional realizada pelo movimento quilombola e por organizações de direitos humanos. Na audiência realizada em fevereiro deste ano a  Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) recomendou ao Estado brasileiro a necessidade de avanço na construção de plano nacional de titulação, com previsão orçamentário para atendimento à demanda.

A responsabilidade do Estado brasileiro em destinar orçamento para titulação dos territórios quilombolas está no alvo de um dos recursos julgados pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), na próxima terça-feira (17), também na capital. O julgamento trata dos direitos territoriais da Comunidade Quilombola Invernada Paiol de Telha, localizada em Reserva do Iguaçu (PR).

Outro foco do debate da agenda do dia 16 será sobre a responsabilidade do Poder Judiciário em atuar em casos de evidente violação de direitos humanos. Atento à autonomia dos poderes, o Supremo Tribunal Federal (STF) já julgou, em casos anteriores, que cabe ao Judiciário determinar que a “Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação de Poderes” (STJ Processo ARE 886710).

O papel da justiça circundará o julgamento no dia seguinte (17) pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), também na capital, de dois recursos sobre direitos territoriais da Comunidade Quilombola Paiol de Telha, localizada em Reserva do Iguaçu (PR). A Comunidade é alvo de um pedido de reintegração de posse. Outro recurso trata da decisão que obriga o Estado brasileiro a destinar recursos ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para a titulação da integralidade do território. A sessão está agendada para as 10h.

O debate é aberto ao público e não exige inscrição prévia.

SERVIÇO
Debate Direitos Territoriais Quilombolas: paralisia do Estado e violações de Direitos Humanos
Data:
 16 de setembro, das 14h às 17h.
Local: Auditório do Ministério Público Federal (Rua Otávio Francisco Caruso Da Rocha, 800. Bairro Praia de Belas.)
Realização: Comunidade Quilombola Paiol de Telha, Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Frente Quilombola Rio Grande do Sul, Federação das Associações das Comunidades Quilombolas do Rio Grande do Sul (FACQ), Coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial do Rio Grande do Sul, Instituto de Assessoria das Comunidades Remanescentes de Quilombo (Iacoreq) e Terra de Direitos.



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Ações: Quilombolas
Casos Emblemáticos: Comunidade quilombola Paiol de Telha
Eixos: Terra, território e justiça espacial