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Estudo alerta que controle de desmatamento nas Unidades de Conservação da Amazônia regrediu ao menos 10 anos


Falta de um plano de controle do desmatamento será pauta de julgamento no Supremo Tribunal Federal, no próximo dia 30

Foto: Op. Verde Brasil 2 / Agência Brasil

O Supremo Tribunal Federal tem a possibilidade de garantir a retomada do Plano de Prevenção e Controle de Desmatamento na Amazônia Legal, o PPCDAm. No dia 30 de março, os ministros devem julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 760, protocolada em novembro de 2020 por sete partidos políticos em articulação com 10 entidades para exigir a retomada do PPCDAm e o cumprimento das metas climáticas assumidas pelo Brasil.

Uma análise produzida pela Terra de Direitos revela que o desmonte da política ambiental no Brasil - e principalmente a desestruturação do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), que compreendia ações nos 9 estados da Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Estado do Maranhão) - atinge com força as Unidades de Conservação (UCs) da região.

Desde que o PPCDAm encerrou sua 4ª e última fase de operação, em 2020, as taxas de desmatamento entre unidades de conservação na Amazônia Legal tiveram um aumento de quase 25%. Isso resultou no registro do pior índice, até então, da série histórica do portal TerraBrasilis, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais: em 2020, foram registrados 1.183,58 km² desmatados em UCs da Amazônia, uma área equivalente a mais de 1,1 milhão de campos de futebol.

 

Apenas no triênio entre 2018 e 2020, as unidades de conservação da região perderam uma área quase como do tamanho da capital do Mato Grosso, Cuiabá: foram 3.052,77 km² desmatados - 45% a mais do que a área desmatada no triênio anterior (2015-2017). “A destruição da floresta regrediu a patamares de 10 anos atrás e o percentual de aumento da degradação no interior das unidades de conservação é maior do que no restante da floresta”, alerta o material publicado pela Terra de Direitos.

Criado em 2004 para diminuir o desmatamento na Amazônia e criar condições de desenvolvimento sustentável na região, o PPCDAm englobou importantes ações de proteção à floresta, como a criação de novas Unidades de Conservação  e o reconhecimento de Terras Indígenas, especialmente no entorno da BR-163 (no chamado Arco do Desmatamento - área em que se registrava os maiores índices de desmatamento -, que abrange os territórios do oeste do estado do Maranhão e sul do Pará, estendendo-se em direção a oeste, pelos estados de Mato Grosso, Rondônia e Acre).

Apenas na primeira fase do plano, entre 2004 e 2008, 81 unidades de conservação foram criadas na Amazônia Legal, que atualmente conta com mais de 350 Unidades UCs que cobrem uma área de 1.179.414 km² - ou seja, 28,59% do território da região amazônica.

 

O PPCDAm foi desvalorizado pelo Plano Nacional para o Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa - uma medida marcada por pontos controversos, que abre brechas para flexibilização da regulação ambiental, conforme aponta a análise da Terra de Direitos. A Terra de Direitos participa do julgamento da ação pelo STF na condição de amicus curiae (ou amiga da corte), e os dados apresentados no estudo elaborado pela organização podem contribuir para as discussões.

Enfraquecimento do Plano

A análise da Terra de Direitos destaca que, apesar de o encerramento oficial da última fase do PPCDAm ter acontecido em 2020, o Plano já enfrentava uma série de dificuldades que praticamente inviabilizaram ações efetivas. As taxas de desmatamento na Amazônia Legal e nas unidades de conservação da região, que estavam em queda desde o início da implementação do Plano, em 2004, voltaram a crescer em 2013 - ano em que a coordenação do Plano deixou de ser executada pela Casa Civil e foi transferida para o Ministério do Meio Ambiente (MMA).

Mas o PPCDAm viu seu maior ataque em 2019, quando instâncias de nível estratégico e executivo foram extintas ou sofreram reduções orçamentárias, o que acabou limitando ou paralisando ações previstas no Plano. Em abril daquele ano, por exemplo, um decreto presidencial extinguiu o Grupo Permanente de Trabalho Interministerial e a Comissão Executiva do Plano, instâncias apontadas como fundamentais para a execução do PPCDAm. No início do ano de 2019, o governo também já havia extinguido o Departamento de Floresta e Combate ao Desmatamento, órgão subordinado ao MMA e responsável pela Secretaria Executiva do PPCDAm e do PPCerrado. Como resultado desse desmonte, 10% do desmatamento na Amazônia em 2019 aconteceu em unidades de conservação.

Apesar de estar previsto que a 4ª fase do PPCDAm encerraria em dezembro de 2020, o Plano foi encerrado oito meses antes, em abril daquele ano. No momento em que o Plano de controle de desmatamento na Amazônia foi encerrado, os índices de desmatamento estavam 64% acima da meta estabelecida na Política Nacional de Mudança do Clima, de 3.925 km².

Para Dione Torquato, secretário geral do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), ao contrário do que se tem com a descontinuação do PPCDAm, no atual cenário o governo federal deveria estabelecer políticas públicas que garantam o fortalecimento de áreas de proteção como as unidades de conservação. “O governo deveria implementar políticas que dêem maior sustentação, segurança e governança desses territórios, não extinguir políticas públicas como o PPCDAm que mostrou avanços, não só no reconhecimento e criação dessas áreas, mas também na implementação desses territórios nas décadas passadas”, afirma.

Desmonte orçamentário

Além do enfraquecimento do PPCDAm, uma série de medidas acentuou ainda mais a pressão sobre os territórios em unidades de conservação, com o aponta o estudo da Terra de Direitos. Órgão responsável pela gestão das Unidades de Conservação, o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) teve cortado 26% do orçamento previsto para a criação, gestão e implementação das UCs federais, em 2019. Estas mesmas ações sofreram um corte de 61,5% no orçamento autorizado entre 2018 e 2021, tendo no último ano o menor Projeto de Lei Orçamentária Anual em 20 anos.

Além disso, a falta de fiscalização ambiental e de impunidade marcam esse último período.

Entre 2014 e 2018, a média anual de julgamentos de processos por infrações contra a floresta era de 5,3 mil. Em 2019 foram apenas 113 decisões e em 2020 registrou-se somente 20. Entre 2019 e 2020, a média de pagamento de multas por crimes contra a flora despencou 93%, no comparativo com os quatro anos anteriores. “A não cobrança das multas favorece os degradadores e o desmatamento ilegal”, destaca o relatório.

Pedro Martins, assessor jurídico e coordenador do Programa Amazônia da Terra de Direitos, pontua como o desmonte orçamentário impacta de forma sistemática os órgãos de fiscalização ambiental. "Com a abrupta redução orçamentária da verba destinada ao ICMBio, quebra-se uma das pernas de sustentação do PPCDAM que é o fortalecimento de órgãos que atuam nas ações de comando, controle e ordenação territorial, como IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), FUNAI (Fundação Nacional do índio) e ICMBio".

Acesse o estudo completo

 



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