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Apanhadoras de flores cobram autonomia sobre seus territórios durante entrega dos protocolos ao MPF e ICMBio


Protocolos comunitários de consulta prévia foram entregues nessa terça-feira (11), em Diamantina (MG)

Representantes das comunidades tradicionais participam da agenda. Foto: Gisele Barbieri

 

 

Representantes das comunidades de apanhadoras de flores sempre vivas do estado de Minas Gerais (MG) entregaram reinvindicações para a preservação de seu modo de vida tradicional aos representantes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), do município de Diamantina (MG) e membros do Ministério Público Federal (MPF), nesta terça-feira (11).

O reconhecimento como comunidades tradicionais que ocupam áreas de uso comum e que, com suas práticas ancestrais, há mais de 300 anos preservam seus territórios, são algumas delas. Um ato, realizado na sede do ICMBio em Diamantina (MG), marcou a entrega de dois protocolos comunitários de consulta prévia de sete comunidades da porção meridional da Serra do Espinhaço (MG). Um dos protocolos aborda como deve ocorrer o processo de consulta prévia nas comunidades de apanhadoras das comunidades de Macacos, Pé de Serra e Lavras. O outro, sobre as comunidades quilombolas de apanhadoras dos municípios de Vargem do Inhaí, Mata dos Crioulos, Raiz e Braúnas.

“Estamos fazendo história. Anos atrás estávamos na invisibilidade, não sabíamos nem que tínhamos direito a ter direitos. Nosso desejo é que isso seja respeitado como uma lei. Aqui está tudo explicado sobre como vamos responder às demandas de qualquer empreendimento que atinja nosso modo de vida tradicional”, lembrou Maria de Fátima Alves, apanhadora e membro da coordenação da Comissão em Defesa dos Direitos das Comunidades Extrativistas (Codecex).

A consulta prévia das comunidades tradicionais é um instrumento de proteção às comunidades previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a qual o Brasil é signatário desde 2002. A Convenção da OIT diz que nenhuma modificação em territórios tradicionais pode ocorrer sem a devida consulta aos povos desse território.

“Esse é o nosso modo de vida, é o que viveram nossos avós, eu, meus filhos. Nesse documento também estão nossos deveres, pois os apanhadores de sempre-viva também defendem a natureza, é um dos nossos objetivos”, conta Aldair Souza, da comunidade de apanhadoras/es de Pé de Serra.

lia que o lançamento dos protocolos inaugura uma nova fase de negociação entre o ICMBio e as comunidades. Foto: Gisele BarbieriO Procurador do Ministério Público Federal (MPF), Edmundo Antônio Dias, avalia que o lançamento dos protocolos inaugura uma nova fase de negociação entre o ICMBio e as comunidades. “O que está aqui [nos protocolos], em sentido formal, pode não ser uma lei, mas em sentido material é uma norma que vincula o ICMBio com relação à quaisquer medidas administrativas que eles venham a fazer. Para que uma consulta prévia, livre e informada, prevista na Convenção 169, seja juridicamente válida, o ICMBio precisará seguir todas as regras que estão aqui, ditas pelos protagonistas dessa história que vocês, eventualmente, por uma medida administrativa, podem afetar”, enfatizou o procurador do MPF durante o ato de entrega dos documentos.

Frederico Drumont Martins, coordenador regional do ICMBio, disse que o órgão recebe com satisfação a publicação desses protocolos e, segundo ele, as comunidades poderão contar com o empenho dos membros do ICMBio no cumprimento das determinações ali definidas. “Espero que a gente possa ter uma nova página no relacionamento com esses territórios. Claro que vamos tentar cumprir o protocolo e, se não conseguirmos, que vocês possam estar próximos para andarmos juntos”, pontuou ele.

Os dois protocolos foram elaborados pelas Comunidades, com assessoria da Codecex e da Terra de Direitos.

Parque Nacional
A criação do Parque Nacional das Sempre Vivas, em 2002, no município de Diamantina, é um exemplo de intervenção em territórios tradicionais sem obedecer ao que prevê a Convenção 169.  O Parque, administrado pelo ICMBio, sobrepôs uma área de mais de 120 mil hectares aos territórios tradicionais de apanhadoras/es de flores sempre-vivas e das comunidades quilombolas dessa região. Desde o ano de criação do Parque são registradas inúmeras violações que afetam diretamente essas comunidades, dentre elas a expulsão de seus territórios e restrições a colheita de flores, principal atividade econômica dessas comunidades.

O Parque é categorizado como unidade de conservação integral, o que impede diversas atividades que sempre foram realizadas por essas comunidades. A luta das apanhadoras de flores é para a recategorização do Parque Nacional das Sempre-Vivas, além da elaboração de um termo de compromisso coletivo entre o ICMBio e as comunidades tradicionais. O termo de compromisso irá, por exemplo, permitir uma harmonia entre os objetivos da Unidade de Conservação e as práticas tradicionais das comunidades.

Denúncia
A Terra de Direitos e a Codecex entregaram ao ICMBio e ao MPF, uma representação com um resgate sobre a relação das comunidades apanhadoras/es de flores com o ICMBio, parques estaduais e unidades de conservação. Além de informações sobre as características das comunidades e de como é possível viabilizar o respeito à consulta prévia.

“O respeito à consulta prévia que, inclusive, perpassa por esses protocolos comunitários entregues, combina muito com esse encontro aqui, que retoma o diálogo com o ICMBio para dar continuidade a questões importantes para as comunidades como a elaboração do termo de compromisso”, concluiu a assessora jurídica da Terra de Direitos, Camila Cecilina Martins.

2º Festival Comunitário das Apanhadoras de flores Sempre-Viva
Os protocolos serão lançados oficialmente durante a 2ª edição do Festival Comunitário das Apanhadoras de flores Sempre-Viva, na comunidade Pé de Serra, município de Buenópolis (MG). O festival, que em 2019 acontece de 14 a 16 de junho, é uma celebração tradicional da comunidade que marca a colheita de flores, botões, frutos secos e sementes de mais de 240 espécies. A colheita é a principal atividade e fonte de renda das comunidades. Além da colheita, serão realizadas atividades de formação, debates, oficinas, feiras de comercialização de produtos, produzidos pelas comunidades, e atrações culturais.

 



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